Etimologicamente, o sentimento de adoração é um estado de prostração e de reverência. O conceito de adoração, no entanto, se amplia pela necessidade de identificar o ser a quem se deve adorar; conhecer as exigências da adoração adequada; destacar as formas variadas de adoração; permanecer no lugar estabelecido para evocar esse sentimento. No cenário do Antigo Testamento, o lugar da autêntica adoração, onde todos os critérios requeridos se manifestavam, era o Tabernáculo de Deus; mais tarde, o Templo de Jerusalém. A razão imperiosa para definir o lugar de adoração foi determinada por Deus, para que o Ser divino pudesse morar entre Seu povo.
O objetivo primário de manter um lugar apropriado para expressar adoração a Deus era o da renovação das promessas da Aliança. Deus faria de Abraão uma grande nação e lhe daria a terra por herança. Em palavras mais francas: Deus faria de Abraão uma nação próspera e que estivesse sob a proteção divina. A adoração no lugar determinado por Deus implica na expressão de fervorosa reverência com os ouvidos da humildade atentos para ouvir as promessas de Deus. Assim ocorreu em Siquém (Gn 12:6), em Manre (Gn 13:18), em Berseba (Gn 21:33) e em Betel (Gn 28:16-19).
No período da peregrinação, e sob a liderança de Moisés, o senso da presença de Deus devia acompanhar o passo lento dos que foram libertos. Esse sentimento era expresso na visualização constante do Tabernáculo de Deus. O serviço nesse lugar de adoração foi incrementado com o sacrifício contínuo do cordeiro; símbolo da morte do Salvador prometido. Mais tarde, o Tabernáculo foi substituído pela construção imponente do Templo de Salomão, que, ao ser concluído ficou cheio da glória do Senhor (1Rs 8:11). Em termos de religiosidade, o povo de Israel obteve favor desmedido com a construção do Templo de Jerusalém. Aquele era o lugar de adoração; ali podiam ter senso da presença de Deus; ali o povo podia ouvir com os ouvidos do espírito, as promessas da Aliança; ali o povo podia antever o sacrifício do Redentor para promover a salvação final. Mas a indiferença às prescrições divinas, a influência dos costumes e tendências idolátricas promovidas por outras nações, o desregramento dos líderes espirituais, levou historicamente, ao abandono da importância do Templo como símbolo de religiosidade. Fatidicamente, logo aconteceu a destruição do Templo e o exílio.
O rei Josias, de Judá, governou durante 31 anos, em Jerusalém (2Cr 34:1), desde
Em
Devido à rebelião de Jeoaquim, rei de Judá, Nabucodonosor realizou uma segunda invasão de Jerusalém (
O Templo de Jerusalém, que brilhava com esplendor pelo material dourado empregado nas suas paredes e móveis; e muito mais, pelo brilho celestial da Shekinah, símbolo da presença de Deus, foi considerado com desdém pelos líderes judeus, anulando dessa maneira a definição do Templo como lugar de adoração. A tendência religiosa era seguir os padrões de adoração das nações pagãs, caracterizadas pela idolatria e a prostituição. Os cultos idolátricos eram celebrados com práticas de pródiga sensualidade. Centenas e milhares de moças, falsamente chamadas de “sacerdotisas”, eram usadas para concretizar o ritual de perversão. Mas Israel, imitando essa prática, foi além daquela pretensa mostra de religiosidade, estabelecendo nessas celebrações, pessoas do sexo masculino para dar mais realce à obscenidade. Foram identificados pelo tradutor bíblico como “prostitutos cultuais” (1Rs 14:24; 15:12). Nessas condições, o Templo perdeu toda significação como lugar de adoração a Deus, e devia ser retirado.
Vários critérios podem ser usados para diferenciar a religião verdadeira das que não o são. Mencionaremos dois critérios: o da temporalidade do grupo religioso; quer dizer que uma religião que existiu alguns anos e logo não tem vigência, não pode ter a característica de ser veraz. Outro critério: consciência da revelação divina; Nenhuma expressão religiosa surgida pelo esforço racional da mente ou impulso de algum tipo de sentimento pode ser verdadeira, pois precisa da revelação divina através de seus servos, os profetas. A religião do povo de Israel estava assentada sobre a revelação divina desde o período patriarcal. Deus Se revelou ao povo de Israel através das Suas mensagens e do Seu poder: na vida de Abraão, no Êxodo, na peregrinação pelo deserto, na posse da terra de Canaã, na vida de Elias enfrentando os sacerdotes de Baal, etc. O símbolo mais eloquente da religião de Israel como expressão verossímil era o Tabernáculo do Senhor ou o Templo de Jerusalém. Ali, o israelita podia exprimir sua adoração a Deus, consciente da Sua revelação.
Durante o período do exílio babilônico, o povo judeu estava desprovido do símbolo da sua religiosidade: o Templo. Seu sentimento de adoração ficou então mais anuviado pela autoridade vigente que impunha, mediante seu poder civil e religioso, a obrigatoriedade de adorar a imagem da religião babilônica. Assim tinha sido nos tempos pretéritos, quando os amigos de Daniel foram colocados em situação de testar sua fé, como adoradores da verdadeira entidade divina a quem é tributada essa adoração. Não era momento de balançar sentimentos de adoração entre duas forças antagônicas, que impõem a seus fiéis adoração e obediência; mas de confirmar a fé. Os três jovens hebreus passaram a prova declarando que eram adoradores do único Deus verdadeiro que Se revela através das Suas Leis e do Seu poder.
Apesar das ameaças proferidas, os jovens hebreus manifestaram sua profunda convicção da revelação divina e afirmaram que, mesmo que Deus não revelasse Seu poder naquelas circunstâncias, eles ainda assim continuariam a adorá-Lo. Mas o verdadeiro Deus Se revelou novamente mostrando Seu poder salvador ao livrar os jovens dos efeitos do fogo devorador.
Na planície desértica da Mesopotâmia, os ventos que conduziam as partículas arenosas do solo se tornaram testemunhas de eventos negativos ao projeto divino. Ciro, o grande incentivador da construção do Templo de Jerusalém, caiu morto, atravessado pela ponta fatídica de uma flecha lançada na fragorosa batalha contra os Magetas, tribo oriental conduzida pela rainha Tomiris (
No lento início da construção do Templo, inimigos do povo judeu se levantaram para impedir que o magnífico edifício fosse erigido. A autoridade política que respondia por esse território diante do governo de Dario procurou impedir o prosseguimento da obra mediante carta acusadora enviada ao rei (Ed 5:3-17).
Os judeus que voltaram a Jerusalém foram afetados por essa névoa política, permitindo que a indiferença às coisas espirituais enchesse suas mentes conturbadas. A tendência era buscar o conforto pessoal construindo residências custosas em detrimento do interesse pela construção do Templo cujas ruínas ainda eram visíveis (Ag 1:4). O esforço para conseguir o bem material os levava ao extremo irresistível de trabalhar com denodo, recebendo como recompensa apenas o necessário para satisfazer a cobiça prazenteira. As palavras proféticas bem ilustram essa condição: “Tendes semeado muito e recolhido pouco; comeis, mas não chega para fartar-vos... e o que recebe salário, recebe-o para pô-lo num saquitel furado” (Ag 1:6).
Naquela condição anômala de comportamento social dos judeus, Deus, na Sua misericórdia, deixou ouvir Sua voz por intermédio dos profetas para estimulá-los a viver uma vida de esperança e satisfação real (Es 5:1). Uma severa admoestação foi pronunciada pelo profeta Zacarias, que recebeu a voz reveladora de Deus no segundo ano de governo do rei Dario (
A ação profética foi determinante para que o entusiasmo ressurgisse e os judeus reiniciassem a obra, liderados por Zorobabel e o sumo sacerdote Josué (Ag 1:12). A obra alcançou seu objetivo. Sobre a parte mais alta da colina de Moriá, resplandecia o Templo, não com o brilho refulgente do primeiro, mas com a esperança renovadora que só um lugar de adoração pode oferecer. A dedicação desse Templo foi um ato de regozijo apoteótico porque exaltava o nome do Senhor. Era o sexto ano do reinado de Dario (
Assim, o Templo, novamente passou a cumprir sua função sublime de ser lugar de adoração.
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