13 Não queremos, porém, irmãos, que sejais ignorantes a respeito dos que dormem, para que não vos entristeçais, como fazem os demais que não têm esperança.
O mundo pagão daqueles tempos não tinha esperança nenhuma de vida depois da morte. Uma inscrição típica encontrada em um túmulo demonstra esse fato: “Eu não existia. Vim a existir. Não existo. Não me importo.”
Os gregos em especial, apesar de sua imaginação extremamente fértil e sua farta mitologia, não tinham coisa alguma que servisse de consolo aos que perdiam familiares e amigos. A grande esperança dos gregos era justamente livrar-se do corpo, que era a prisão da alma. Por que alguém desejaria que seu corpo fosse ressuscitado? Além disso, como seria possível ressuscitar o corpo, uma vez que seus elementos estariam decompostos e misturados com a terra? Para eles, a doutrina da ressurreição era absurda e impossível (Warren Wiersbe, Comentário Bíblico Expositivo).
Parece que, em nossos dias, não se percebe muita diferença nas ideias concernentes à morte e ao destino do ser humano. É claro, os conceitos e argumentos são mais sofisticados, rebuscados e envolventes se comparados aos antigos. Mas as diversas conclusões continuam incongruentes e ineficazes em oferecer esperança a corações doloridos pela separação de entes queridos.
Exatamente por isso quero aproveitar a oportunidade propiciada pelo assunto em pauta na lição desta semana, para tentar oferecer aos leitores uma reflexão mais segura sobre este tema tão antigo e ao mesmo tempo tão “pós-moderno”.
Os cristãos de Tessalônica estavam preocupados com seus queridos que haviam falecido. Qual seria o destino dessas pessoas quando o Senhor voltasse? Estariam em desvantagem em relação aos vivos? Os vivos, na vinda de Cristo, teriam algum privilégio em relação aos que faleceram? Em outras palavras, a inquietude dos tessalonicenses não era simplesmente com o destino dos mortos, mas também quanto à relação entre a ressurreição dos mortos e o arrebatamento dos vivos. No texto para o estudo desta semana, Paulo responde a essas perguntas e oferece encorajamento e consolo fundamentado na segura revelação divina. Atente para o esboço que se segue:
Os tessalonicenses não negavam a ressurreição dos mortos, como acontecia com os crentes de Corinto (1Co 15). O problema era simplesmente uma carência de mais luz sobre o tema. Isso era natural em cristãos que não haviam desfrutado mais que algumas semanas de instruções apostólicas. Suas concepções sobre a ressurreição eram obscuras; sua fé sobre este ponto, vacilante. Depositavam todas as suas esperanças no futuro regresso de Cristo, no estabelecimento de Seu reino, mas não sabiam bem como participariam desse reino os que eles viam morrer antes da grande consumação de todas as coisas. Assim sendo, sofriam de uma tristeza muito natural (v. 13). O propósito do apóstolo na instrução que segue, foi oferecer-lhes verdadeira consolação (v. 18).
Tristeza e falta de esperança (1Ts 4:13)
“Não queremos, porém, irmãos, que sejais ignorantes com respeito aos que dormem...”
Ao apóstolo não importava apenas a pureza da doutrina, uma compreensão clara e abrangente era decisiva nas igrejas. A igreja de Deus, justamente por ser respeitada como tal, não pode jamais “ser ignorante” a respeito de aspectos importantes da doutrina. Cristãos genuínos precisam ter os devidos conhecimentos em todas as questões essenciais e ser capazes de discernir de forma nítida o que é certo e o que é “meio certo”.
Observe que o apóstolo não “consolou” a igreja afirmando que os falecidos tinham uma grande vantagem, pois já chegaram ao alvo, já estavam na glória junto do Senhor, glória que nós, os vivos, ainda precisamos esperar. Nenhuma palavra nesse sentido! Nenhuma palavra sobre “entrar no Céu”.
Os cristãos de Tessalônica não deveriam “estar entristecidos como os demais que não possuem uma esperança”. Contudo, essa certeza consoladora, que supera toda tristeza, não assegurava que queridos falecidos já estivessem no Céu, na glória! Não é isso que o texto inspirado afirma. Ao contrário, uma breve frase diz: nós experimentaremos o próximo grande evento da história da salvação, a vinda do Senhor, junto com os que já morreram. Quer dizer, nós todos vivenciaremos isso em conjunto.
Todo o “consolo” está contido na palavra “juntamente”: “arrebatados juntamente com eles” (v. 17). Ou seja, na verdade ninguém tem uma vantagem em relação ao outro. Nem a igreja que ainda vive na Terra tem vantagem em relação aos mortos, nem os mortos têm vantagem alguma em relação a nós, como se agora já estivessem na glória “antes de nós”.
Para os ainda vivos e para os já adormecidos vale um decisivo “juntamente”. Se os que agora morrem no Senhor participarão simultaneamente conosco da parousia, então tudo está plenamente resolvido. A rigor não é necessário saber mais do que isso.
“Se cremos que Jesus faleceu e ressuscitou”,nossa “esperança” não pode se dissociar de nossa “fé”. Ela decorre de nossa fé e a fé revela clareza total sobre a trajetória de Jesus. Ele morreu, mas não permaneceu na morte; foi ressuscitado. Isso, porém, não foi uma experiência particular, mas algo que aconteceu ao Cristo, o Cabeça de Seu corpo.
Fundamentados nesse versículo, três coisas são significativas para nós.
Primeira: qualquer tentativa de demonstrar a “imortalidade da alma” e fundamentar a esperança sobre isso está inteiramente descartada. A ação manifesta de Deus em Jesus propicia um fundamento completamente distinto, e muito sólido.
Segunda: por pertencermos a esse Jesus que “morreu e ressuscitou” não fomos deixados a sós nem abandonados em nossa morte. Não importa que seja martirizado em nome dEle, ou que definhe sob uma enfermidade, se meu fim é solitário ou não, o próprio Jesus tem esse fim em Suas mãos.
Finalmente, a frase: “Deus, mediante Jesus, trará em Sua companhia, os que dormem.” Visto que Deus cuidou do Senhor Jesus também nos dias entre a morte e ressurreição, Ele também cuidará “do mesmo modo” dos cristãos adormecidos e os “reunirá com Jesus”.
Os adormecidos são e continuam sendo “mortos”. Mas, “cristãos” são “mortos em Cristo”, ou seja, mortos sobre os quais “Jesus Cristo é o Senhor”, da mesma forma que sobre os viventes (Pois Cristo morreu e viveu de novo para ser o senhor tanto dos mortos como dos vivos. Rm 14:9; Hb 12:23). Até mesmo na condição de mortos, não estão separados de Cristo, logo estão sob o senhorio dEle, pela paz dEle, pela proteção dEle. Não estão perdidos.
Podemos, então, ter certeza de uma única coisa: nossos mortos estão abrigados em Cristo e de maneira nenhuma estarão em desvantagem no dia da parousia (Para este arrazoado me fundamentei na obra de Werner de Boor - Comentário Esperança).
Em todas as cartas apostólicas, é impressionante que o fundamento da mensagem evangélica era o fato de haver Jesus, o Messias, ressurgido dentre os mortos. Em parte alguma os apóstolos se referem à ideia de que Sua alma tivesse voltado do Céu. Mencionam expressamente que Ele ressurgiu dos mortos (Lc 24:3-6). Isso é repetido vez após vez (Questões sobre Doutrina, p. 358).
Paulo deixou claro a seus leitores originais e a nós hoje, o fato de que nossos mortos dormem abrigados em Cristo e de maneira nenhuma estarão em desvantagem no dia da parousia.
Por isso, foi a essa parousia que ele se dedicou a seguir. Surge então o termo técnico parousia. Seu sentido literal é presença, mas também chegada, podendo ser utilizado no linguajar corriqueiro acerca da vinda de uma pessoa (1Co 16:17; 2Co 7:6). Mas já na linguagem daquele tempo, a palavra podia se revestir de uma conotação solene “oficial”. Era empregada para a “visita governamental”, para o “advento” de um soberano, especialmente para o novo imperador, que “vinha” para Roma depois de anos de distúrbios e conflitos, trazendo felicidade a todos com sua “presença”, colocando tudo em ordem.
Também aqui na carta se trata da chegada de um soberano: “parousia do Senhor”. E o que o cristianismo da época entendia por “chegada do Senhor” era decididamente o contrário de todas as entradas triunfais e visitas governamentais daquele tempo. Agora vem o verdadeiro e real soberano do mundo que, de fato e definitivamente, traz salvação e paz à Terra, enquanto os adventos dos imperadores terrenos, apesar de toda a ostentação de pompa e entusiasmo, conduziam tão somente a novas decepções (Werner de Boor, Comentário Esperança).
Esta é, pois nossa certeza: quando o Senhor descer do trono celestial “os mortos em Cristo ressuscitarão primeiro”. Portanto, o primeiro efeito da parousia penetra até mesmo no mundo dos mortos, de sorte que justamente os cristãos adormecidos “de forma alguma” estarão em desvantagem diante dos demais. Eles ressuscitam alcançando toda a plenitude da vida divina. Somente então o efeito daparousia se volta “aos vivos que sobram até Sua volta.”
Daí se conclui que a ressurreição do cristão e sua ascensão não se separam (v.16, 17). Mais: ressurreição e ascensão acontecem em união com Ele, com Jesus.
Paulo fundamentou sua consolação nas realidades da ressurreição de Jesus e Sua vinda. A ressurreição dEle é o paradigma para o cristão que faleceu (v. 14), que no momento de Sua vinda ressuscitará e, junto com os que estiverem vivos, serão arrebatados (v. 15-17).
A razão pela qual o apóstolo não quis que os tessalonicenses ignorassem o destino dos cristãos mortos era “que não se [entristecessem] como os que não têm esperança”.
Paulo não proibiu o luto para o cristão frente à morte, somente desejou que o luto não fosse desesperado “como [o desses] outros que não têm esperança”.
“Esses outros” é uma referência aos não cristãos, que são também chamados “os de fora” (4:12). Gentios inconversos que se descrevem como aqueles “que não tem esperança”. Em contraste, o luto dos cristãos deve estar subjugado por sua esperança, com base na ressurreição de Cristo e a promessa de Sua vinda. Os apóstolos pregavam esperança em um mundo que carecia dela desesperadamente.
A Bíblia, como nesta passagem paulina, sempre amarra nossa verdadeira esperança ao nosso consolo fundamental em Jesus e Seus grandes feitos passados e vindouros. Sua ressurreição, Sua vinda gloriosa, Sua vitória, Sua soberania. Isso não deveria ser também consolo suficiente para nós na morte?
Deus nos bendiga!
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