No comentário da lição 2, vimos que o
plano de Deus para a proclamação do evangelho envolve uma parceria com seres
humanos imperfeitos que testemunham, tanto individual (lição desta semana) como
coletivamente (lição da próxima semana). Por outro lado, a Bíblia também ensina
que a resposta ao convite da salvação, em última instância, pertence à esfera
individual.
“O sal deve ser misturado com a substância em que é
posto; é preciso que penetre nessa substância a fim de conservá-la. Assim, é
com o contato pessoal e a convivência que as pessoas são alcançadas pelo poder
salvador do evangelho. Não são salvos em massa, mas como indivíduos. A
influência pessoal é um poder. Cumpre-nos achegar-nos àqueles a quem desejamos
beneficiar” (Ellen
G. White, O Maior Discurso de Cristo, p. 36).
O evangelismo público nunca substituirá o evangelismo pessoal. Grandes
encontros jamais proverão, por si só, o que é necessário para uma transformação
real. Ensino, adoração e encorajamento das grandes reuniões são complementos
para as interações individuais, que constituem o contexto único capaz de
atender às necessidades individuais e praticar um evangelismo verdadeiramente
encarnacional (comentário da lição 5). Nesta semana, o objetivo é tecer algumas
considerações sobre essa interação usada pelo Espírito Santo para transformar
vidas para a eternidade.
I. O exemplo de Jesus
Apesar das várias pregações a multidões, o
ministério de Jesus foi marcado por poderosos encontros pessoais, geralmente
com aparência de ocasionais, em que transformações foram visíveis. Jesus
desafiou o jovem rico (ver Lc 18:21, 22), convidou Mateus para um
relacionamento com Ele (ver Mt 9:9), confortou Maria e Marta (ver Jo 11:23-26),
visitou Zaqueu (ver Lc 19:5, 6), Se encontrou com a mulher samaritana junto ao
poço (ver Jo 4:4-7), entre outros. Cada vez, Jesus apresentou o evangelho de acordo
com as necessidades das pessoas, daí a necessidade de se entender o contexto
(Ver o comentário da lição 5).
Em atitude de obediência ao Pai e constante comunhão com Ele, Jesus buscava
relacionamentos com todos os tipos de pessoas com o objetivo de servir, curar,
ensinar e pregar o evangelho. Pelo fato de conhecer a busca espiritual humana,
Jesus logo direcionava a conversa para as questões eternas. Ele apontava para a
Palavra de Deus e para Si mesmo como o Messias e, tratando a todos com bondade
e cortesia, convidava-os a ser Seus discípulos para sempre.
O contato com a mulher samaritana é provavelmente o melhor exemplo. Ela possuía
todas as condições para desconfiar de Jesus. Tratava-se de um homem que era
judeu, o encontro era em público, Ele não deveria iniciar uma conversa com ela,
pois ela era mulher samaritana e, além disso, estava sozinha. Ela esperava ser
ignorada, julgada e desprezada. Confiança para iniciar um diálogo não era
uma atitude natural para aquela mulher.
Jesus começou com o inesperado, ou seja, para quebrar as aquelas barreiras Ele
SE colocou em uma posição de necessidade e pediu sua ajuda. Com essa
iniciativa, Jesus ganhou a confiança da samaritana, recontou sua história e
nela inseriu o Messias como a única solução para a sua vida.
“Se bem que a própria pureza
que de Jesus emanava lhe condenasse o pecado, não proferia palavra alguma de
acusação, mas falava de Sua graça, que lhe podia renovar a alma” (Ellen White, O Desejado de Todas as Nações, p. 189). Aquela mulher se tornou uma
verdadeira discípula e Jesus estabeleceu um modelo de evangelismo pessoal.
II. Preparação
Como tem sido repetido durante o
trimestre, o cristão testifica daquilo que conhece e experimenta. Por isso,
antes do contato evangelístico, é necessário desenvolver quatro características
de uma vida espiritual saudável:
(1) Coração obediente. Tudo começa com um espírito de adoração a
Deus e obediência ao Seu mandado. Isso envolve um coração interessado na
salvação de todos os filhos de Deus e disposto ao sacrifício por eles; também
disposto a permitir que Deus molde a vida do cristão para ser usado como Seu
instrumento. Um coração obediente responde à vontade de Deus com disposição
para servi-Lo.
(2) Vida na presença do Espírito Santo. A Bíblia deixa claro que o Espírito Santo
está diretamente relacionado com a missão da Igreja (ver At 1:8). O
relacionamento de submissão dá permissão ao Espírito Santo para trabalhar
através dos filhos de Deus. O Espírito Santo capacita e protege aqueles que se
engajam nessa batalha espiritual. A vida na presença do Espírito Santo permite
que todos os passos da missão sejam guiados por Deus.
(3) Vida de comunicação com Deus. O evangelismo é uma atividade
essencialmente espiritual. A comunicação com Deus através da oração alimenta a
humildade, conduz à adoração a Deus e intercessão por portas abertas para a
missão e por aqueles que receberão o evangelho. A vida de comunicação com Deus
torna o cristão autêntico e coerente.
(4) Vida de dedicação ao estudo da Bíblia. O conteúdo do evangelismo está revelado na
Bíblia (ver Jo 5:39). Ele deve operar na vida do evangelista antes mesmo de ser
compartilhado com os demais. Só assim a testemunha poderá relatar aquilo que
tem visto e experimentado no relacionamento com Cristo. A vida de dedicação ao
estudo da Bíblia alcança a maturidade e a solidez necessárias para enfrentar os
desafios do evangelismo.
III. Lidando com as pessoas
Se o objetivo do evangelismo pessoal é
testemunhar, com palavras e atos, a respeito de Cristo, é necessário que, nesse
processo de comunicação, duas pessoas estejam envolvidas, ou seja, que haja um
relacionamento. Emílio Abdala enfatiza o princípio da amizade indicando que “o método mais eficaz e natural de
evangelismo ocorre nos relacionamentos pessoais e familiares” (Plantando Esperança, Ministério Jan/Fev
2011).
a. Construindo pontes. As novas dinâmicas da sociedade no início
do século 21 mudaram a maneira pela qual as pessoas se relacionam. A impressão
é de que elas estão mais próximas, apesar de estarem mais distantes. Às vezes,
isso é uma grande ilusão. No geral, o contato pessoal tem diminuído bastante.
Mas o evangelho viaja pelos relacionamentos e, portanto, o “ide” implica em
derrubar muros e construir pontes.
Isso nem sempre é fácil, já que muitas pessoas
com quem devemos nos relacionar são adeptas de outros valores e princípios,
alguns que parecem bem estranhos e até perigosos enquanto que o evangelismo
pessoal requer um investimento de tempo, emoções, espiritualidade, etc. O
incrível é que as outras pessoas muitas vezes não nos veem como muito mais
seguras. Lembre-se de que não existe dicotomia entre ser um amigo genuíno e
intencionalmente agir para que alguém se aproxime de Deus.
b. Testemunho coerente. Se por um lado a sociedade não permite
tantos contatos pessoais, por outro, a curiosidade humana nunca se armou tanto
para observar uns aos outros. As pessoas continuam interessadas em saber como
as outras vivem e quais são as melhores soluções para os desafios da vida. Como
lidamos com o estresse, com dívidas, como tomamos decisões, como educamos os
filhos, como mantemos a saúde, quais são nossas prioridades, como nos
relacionamos com nossa comunidade de fé, etc.
Quanto mais anticristão o mundo se torna,
maior é a necessidade de testemunhos coerentes que apresentem as limitações da
atuação humana e o ilimitado poder de Deus.
c. Orientação divina. Sensibilidade à voz de Deus nos fará
interagir com as pessoas certas, nos momentos mais adequados, com as palavras
próprias que exaltem a Deus.
IV. O que não é evangelismo pessoal
O risco de deturpações do evangelismo
pessoal também está presente. Aqui estão quatro exemplos (Will McRaney Jr., The Art of Personal Evagelism) do que
não faz parte do ato de testemunhar:
(1) Julgar. É necessário ter muita sensibilidade na
hora do contato missionário porque o papel do cristão não é julgar (isso não
aparece na definição de testemunho). O evangelho certamente irá lançar luz
sobre o contexto daquele que o recebe e o Espírito Santo convencerá essa pessoa
da transformação necessária. Principalmente nos contatos iniciais, é importante
permitir que a graça, o amor, e o perdão de Deus alcancem o coração e respondam
às necessidades daquele que recebe o evangelho.
(2) Envergonhar. Os recursos da culpa e da humilhação se
apresentam como uma tentação para alguns que desejam impressionar os
“pecadores”. Enquanto que a curto prazo esse recurso pode parecer proveitoso, a
longo prazo as consequências são geralmente irreparáveis. Entender a distância
entre Deus e o ser humano naturalmente fará a pessoa se sentir envergonhada,
enquanto que o sacrifício de Cristo devolverá a esperança e a certeza de que há
um lugar na família de Deus para aquele que O aceita.
(3) Manipular. O papel do evangelista não é pressionar
alguém para se submeter a Deus. A definição de evangelismo (lição 1) envolve o
convite para aceitar o evangelho, mas convencer as pessoas sobre a verdade é
papel do Espírito Santo. Se esse processo acontecer simplesmente na esfera
humana, se tornará uma competição pela melhor técnica de convencimento.
(4) Vencer um debate. A apresentação de argumentos de forma
lógica e convincente faz parte do evangelismo, especialmente para aqueles que
têm um dom relacionado com a apologética, mas essa não é a função principal da
testemunha. Boas perguntas são mais eficientes com alguns tipos de pessoas do
que respostas bem elaboradas.
(5) Vender. O evangelho deve ser proclamado,
compartilhado, mas não vendido. Obviamente que aqueles que aceitam o evangelho
são grandemente beneficiados em todas as esferas da vida, mas esse não pode ser
o maior apelo para aceitar Jesus.
V. O meu evangelismo
Nessa separação didática, a última parte
do processo é a do compartilhamento do evangelho em quatro etapas:
(1) Contato
inicial: Seu
interesse não se restringe a um contato único, mas estabelecer uma amizade;
(2) Contar a história: Exemplos
de como a verdade transforma a vida de uma pessoa (de preferência a sua)
positivamente são essenciais;
(3) Esclarecer a mensagem: Não
basta comunicar; é preciso comunicar corretamente; e
(4) Fazer o convite: Seu
alvo vai além de uma apresentação sobre o evangelho.
“A influência pessoal é um poder. Quanto mais direto
for nosso trabalho em favor de nossos semelhantes, tanto maior será o benefício
realizado. ... Devemos entrar em íntimo contato com aqueles por quem
trabalhamos, para que, não somente nos ouçam a voz, mas nos apertem a mão,
aprendam nossos princípios, e sintam nossa simpatia” (Ellen G.
White, Evangelismo, p.
439).
“Uma boa abordagem é um
contato inicial, através de palavras e atos, que estabelece um relacionamento
próximo o suficiente para permitir o testemunho por Cristo” (Alvin Reid, Evangelism Handbook, p. 253). Relacionamentos genuínos
começam com interesses em
comum. São nessas ocasiões que as maiores oportunidades
surgem para estabelecer relacionamentos que abrem portas para o evangelismo.
Quantos casos de contatos missionários eu conheço que aconteceram no campo ou
na quadra de futebol!
Por isso, ao buscar oportunidades para esses contatos, faça a si mesmo duas
perguntas:
1. O que é que eu gosto de fazer?
2. Como posso me aproximar de pessoas que
não conhecem Jesus através dessa atividade? Afinal, se você quiser praticar o
evangelismo pessoal você precisa conversar com pessoas “do mundo” que estão
“perdidas”.
Lembre-se de se aproximar das pessoas com
a atitude correta. As pessoas sentem no ar se você realmente se importa com
elas. Palavras erradas, respostas incompletas e raciocínios falhos poderão ser
relevados se houver sincero interesse. Em quinze minutos de conversa, as
pessoas são capazes de descobrir se há verdadeiro interesse por elas, se
acreditamos no que estamos falando e se a mão de Deus tem agido em nossa vida.
Já dizia o grande pensador da comunicação, Marshall McLuhan, que o meio é a mensagem.
O conteúdo da história de Jesus é primordial, mas não se pode esquecer que a
comunicação não verbal, o entusiasmo, o verdadeiro interesse e o exemplo também
contam.
Como o evangelismo pessoal é uma atividade espiritual guiada pelo Espírito
Santo, esteja preparado para a resposta positiva. No primeiro momento, é
importante saber ouvir e fazer perguntas que levem a pessoa a abrir o coração.
Como uma das maiores dificuldades é o momento de conduzir a conversa para o
lado espiritual, é comum o Espírito Santo sugerir caminhos alternativos na
conversa que inesperadamente o levem às melhores maneiras de dar seu testemunho
(Lc 12:12).
A maneira de se comunicar algo e a maneira pela qual isso é entendido nem
sempre são as mesmas. Portanto, os mesmos princípios são aplicáveis para a
continuação do diálogo ao esclarecer o evangelho. Paulo menciona sua
preocupação nesse sentido (Cl 4:4).
O último momento é o de encorajar as pessoas a tomar a decisão e motivá-las a
se unir a você nessa jornada espiritual.
Ilustração
Conta-se a história de um insensível criminoso preso, de quem vários pastores
haviam procurado se aproximar. Normalmente, a abordagem incluía explicar a
situação do pecador e sua necessidade da graça de Deus para a salvação. Mas
isso parecia endurecer o coração daquele detento. Então, um leigo o visitou e
se sentou ao seu lado. Ele disse: “Você e eu estamos numa pior, não é verdade?”
A identificação com aquele homem o levou aos prantos e à entrega de sua vida a
Jesus.
Pensando nessa ênfase do evangelismo pessoal, Rick Richardson redefiniu
evangelismo como sendo conversas com amigos de uma jornada espiritual (Reimagining Evangelism,
p. 66). Com esse modelo de conversão como uma jornada marcada por eventos e não
somente um evento isolado, ele sugere que, ao invés de os cristãos serem como vendedores itinerantes com um alvo,
seria melhor que se portassem como guias de viagens de uma jornada espiritual.
Pr. Marcelo E. C. Dias Professor do SALT/UNASP Doutorando (PhD) em Missiologia pela Universidade
Andrews mecdias@hotmail.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário