sábado, 16 de junho de 2012

Avaliando o testemunho e o evangelismo (comentário ao estudo nº 12)




 

I. A medida do sucesso
A avaliação é tão natural na Bíblia quanto outros princípios de gerenciamento e mordomia, como levantamento, planejamento e organização. Logo no primeiro capítulo da Bíblia, Deus dá Seu parecer sobre a obra da Criação afirmando que ela era muito boa (ver Gn 1:31). Esse princípio de avaliação é aplicado ao povo de Israel e sua fidelidade a Deus, à resposta das pessoas ao ministério de Jesus, aos líderes da igreja apostólica e a cada ser humano, em última instância, no juízo final. No contexto da Igreja, essa prática é evidente no livro de Atos, nas cartas de Paulo e nas cartas às sete igrejas da Ásia menor, nos primeiros capítulos do Apocalipse.

Ultimamente, no entanto, muito se tem discutido sobre qual é a verdadeira medida do sucesso da igreja. No excelente livro The Measure of Our Success, Shawn Lovejoy aponta três perigos das maneiras não-bíblicas de avaliação: comparação, cópia e condenação. Às vezes se mede o sucesso, o sentido de significância e autoestima única e exclusivamente pelos números. A pergunta intrigante do autor é sobre avaliar o que realmente importa: multidões ou conversões? Ele conclui que “encher o auditório é bom; mas encher o Céu é melhor”. Novos membros são a medida essencial para todas as igrejas, mas outros aspectos também são importantes.

Em face dessas observações, “
em vez de eliminar [as avaliações] (como alguns sugeririam), pensamos que é necessário uma mudança nos critérios. Acreditamos que um dos critérios mais importantes é certificar-se de que homens e mulheres estão sendo transformados pelo poder do evangelho” (Ed Stetzer, Transformational Church, p. 25).

Essa avaliação deveria estar concentrada nos seguintes objetivos:
(1) verificar se a igreja está buscando cumprir seus propósitos,
(2) estimular as iniciativas práticas,
(3) encorajar o reconhecimento e o agradecimento,
(4) promover mudanças e inovações,
(5) facilitar a unidade e cooperação e
(6) promover a espiritualidade.

Diante desse cenário, o indicador mais esquecido da avaliação é aquilo para o qual fomos chamados, como cristãos: amar. Mateus 22:37-39 é uma boa lembrança desse requisito. Jesus Se dirige a pessoas religiosas, conhecedoras das Escrituras. Se o componente básico não existir, nenhum modelo, estratégia, estudo sobre evangelismo e testemunho vai ter efeito a longo prazo.
Tudo o que fizermos precisa exaltar Jesus e ser expresso em amor. As pessoas são atraídas por amor, por isso amar as pessoas é a melhor maneira de mostrar para o mundo quem Ele é (The Measure of Our Success).

II. Os propósitos da Igreja
A avaliação do testemunho e o evangelismo precisa estar inserida no entendimento sobre os propósitos da Igreja. Não há como avaliar sem saber onde se deve chegar. Uma forma didática de representar esses propósitos é através das cinco áreas com base em Atos 2:42-47 sugeridas por Rick Warren (no livro Uma Igreja com Propósitos):

(1) adoração – amar ao Senhor de todo o coração;
(2) serviço – amar ao próximo como a si mesmo;
(3) missões – ir e fazer discípulos;
(4) comunhão – batizá-los; e
(5) discipulado – ensiná-los a obedecer.

Na tabela abaixo, Warren procura explicar a relação entre os propósitos e a Igreja, descrevendo as tarefas, objetivos, alvos e consequências para a Igreja.

Propósito
Tarefa
Objetivo
Alvo
Minha vida

A Igreja supre necessidades básicas

Missões
Evangelizar
Missão
Comunidade
Meu testemunho
Propósito para a vida
Adoração
Exaltar
Magnificar
Multidão
Minha adoração
Poder para viver
Comunhão
Encorajar
Membro
Congregação
Meus relacionamentos
Pessoas para conviver
Discipulado
Edificar
Maturidade
Comprometidos
Minha caminhada
Princípios para seguir
Serviço
Equipar
Ministério
Núcleo
Meu ministério
Profissão para cumprir

Apesar de, na prática, os propósitos estarem mesclados e se apresentarem através de mais de uma atividade da igreja, a não ser que se saiba a razão de ser, não há como pensar em avaliação.

Um alerta importante é dado por Reggie McNeal de que “
quando a igreja pensa que é o destino, ela também confunde os critérios. Ela pensa que, se pessoas estão se movendo ao redor e dentro da igreja, ela está vencendo. A verdade é que, quando isso acontece, a igreja está na verdade impedindo as pessoas de ir aonde realmente querem ir: o seu verdadeiro destino” (Transformational Church, p. 26)

III. Dimensões do crescimento integral
Uma Igreja saudável, que conhece e cumpre seus propósitos, deve se desenvolver e amadurecer, tanto como membros individuais, como na coletividade. Em vez de se concentrar em um ou dois índices numéricos, Orlando Costas sugere um modelo com cinco dimensões de crescimento integral.

(1) A dimensão numérica está relacionada à reprodução resultante da proclamação do evangelho e do convite a se unirem à Igreja. Segundo ele, “
o crescimento numérico é parte integrante da visão do que significa ser igreja, especialmente quando a vemos como igreja apostólica e sinal do Reino de Deus na Terra” (Crescimento Integral da Igreja, p. 42).

(2) A dimensão orgânica enfatiza a identidade interna da igreja como um organismo. “
Se uma igreja tem como propósito crescer apenas em número, sem se preocupar com a comunhão, o pastoreio e os relacionamentos, ela será tão impessoal e distante que naturalmente ela mesma limitará seu crescimento numérico” (Ibid.) Essa dimensão inclui a forma de governo da igreja, a estrutura financeira, o estilo de liderança, as atividades características e os cultos.

(3) A dimensão conceitual está relacionada à capacidade da igreja de refletir sobre sua fé, sua razão de existir, sua identidade e missão. Essa dimensão abrange o potencial crítico, teológico e capacidade criativa de continuar sendo relevante diante da constante transformação da sociedade e do cenário cultural. “
A dimensão conceitual não apenas nos capacita a enfrentar o futuro, como nos ajuda a ser a voz profética no presente, a sermos relevantes para nosso tempo e nação” (Crescimento Integral da Igreja, p. 44).

(4) A dimensão diaconal se preocupa em reproduzir o ministério encarnacional de Jesus, Seu amor redentor apresentado de forma prática e Sua ética em todos os aspectos da vida. “
Sem a perspectiva da dimensão diaconal, a igreja perde sua autenticidade e credibilidade, visto que o fato de ser ouvida e respeitada está intrinsecamente vinculado à concretização de sua vocação de amor e serviço ao próximo, bem como sua consequente visibilidade” (Crescimento Integral da Igreja, p. 46).

(5) A dimensão litúrgica está relacionada com o objetivo primário e último da missão (ver comentário da lição 10). A adoração celebra o passado, reconhece o presente e aponta para o futuro – proclamar e experimentar a mensagem.

IV. Qualidades da igreja saudável
Na prática, para que os propósitos sejam alcançados e resultem em um crescimento integral, se observou que há oito qualidades que estão diretamente relacionadas. A conclusão da extensa pesquisa de Christian Schwarz é que o desenvolvimento natural da Igreja está relacionado a oito características importantes para a saúde da igreja.

1. Liderança capacitadora: essa qualidade destaca a importância de líderes empenhados na capacitação dos membros de acordo com a vontade de Deus. Isso envolve a sensbilidade ao Espírito Santo e o interesse sincero nas pessoas. Equipar, apoiar, motivar e mentorear os membros da igreja. Fugir de modelos que utilizam “celebridades” que centralizam tudo em função dos seus talentos, carisma e posição (ver comentário da lição 9).

2. Ministérios orientados pelos dons: essa qualidade busca permitir que o Espírito Santo guie a organização dos ministérios da igreja e a participação individual. Schwarz compartilha que, segundo a pesquisa, esse fator é o que mais influencia a sensação de satisfação e alegria de alguém – seu envolvimento segundo o propósito do Criador (ver comentários das lições 2 e 3).

3. Espiritualidade contagiante: essa característica está relacionada à maneira de se expressar a fé no dia a dia através de compromisso, paixão e entusiasmo. O segredo dessa espiritualidade é uma vida fundamentada na Bíblia, dirigida pelo Espírito Santo e focalizada no mundo (ver comentário da lição 8).

4. Estruturas funcionais: Por incrível que pareça, segundo Schwarz, existe uma confusão em alguns contextos sobre o relacionamento entre as estruturas e a missão da igreja – a primeira serve à segunda. As estruturas têm o propósito de organizar, avançar e facilitar a missão (ver comentário da lição 9).

5. Culto inspirador: Essa qualidade não especifica a liturgia, mas o foco dela. O resultado da presença num dos cultos da igreja tem que ser o senso da presença de Deus e a motivação para o testemunho (ver comentário da lição 10).

6. Grupos familiares ou células: essa qualidade destaca a importância da dinâmica espiritual entre a pessoa e a igreja para produzir ajuda prática, comunidade, e interação espiritual (ver comentário da lição 6).

7. Evangelização orientada para as necessidades: essa característica está relacionada ao interesse da igreja nas pessoas. Schwarz fala em orar, cuidar e compartilhar como sendo a essência do evangelismo relevante (ver comentários das lições 4 e 5).

8. Relacionamentos marcados pelo amor fraternal: essa qualidade é o que torna a igreja magneticamente atraente e se aproxima do verdadeiro objetivo divino para a família de Deus. Schwarz menciona a justiça, a verdade e a graça como expressões práticas do amor fraternal (ver comentário da lição 7).

Ilustração
A altura, ou crescimento, é só uma das medidas consideradas quando as crianças estão se desenvolvendo. Sua relação com o peso é tão importante quanto o crescimento. Afinal, crescer para os lados demais ou de menos indica falta de saúde. Mas levar em conta somente esses dois critérios ainda não é o suficiente. Existe o desenvolvimento dos órgãos internos, dos ossos, das capacidades verbal, psicológica, motora e espiritual.

Uma observação cuidadosa da história da missão mostra que o sucesso ou fidelidade à missão tomou formas diferentes para pessoas, momentos e lugares diferentes. Em alguns casos, após uma longa vida de dedicação, os “resultados” só vieram nos esforços das gerações seguintes. Em outros casos, o chamado de Deus foi para uma vida longe dos holofotes, e até secreta, preservando a verdade. Em alguns casos, o chamado foi para proclamar a mensagem às multidões nos grandes estádios ou então iniciar um grande movimento de restauração de importantes verdades bíblicas entre o povo de Deus. Todos, no entanto, são chamados para contar o que Deus tem feito em sua vida à sua família, aos seus parentes e àqueles com os quais convivem. E foi por isso que o cristianismo cresceu. Todos são ministérios bem sucedidos.

Na busca pelo sucesso, não nos esqueçamos de viver com fidelidade para que, na avaliação final, ouçamos nosso Senhor dizer:Muito bem, servo bom e fiel; foste fiel no pouco, sobre o muito te colocarei; entra no gozo do teu Senhor” (Mt 25:21).

Autor deste comentário: Pr. Marcelo E. C. Dias Professor do SALT/UNASP Doutorando (PhD) em Missiologia pela Universidade Andrews mecdias@hotmail.com





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