sábado, 10 de outubro de 2009

Adoração e dedicação




Introdução


Não são muitas as pessoas que gostam de números, por isso, quando olham para o título do livro que estamos estudando neste trimestre, que é o livro de Números, e julgam que ele tenha 36 capítulos recheados de cifras ou estatísticas, podem se sentir tentadas a não dar a devida atenção ao estudo dessa importante parte da Bíblia.


Quem ultrapassa esse preconceito inicial e começa a estudar o livro de Números percebe que ele nem tem tantas estatísticas, mas se compõe de uma mistura de leis com narrativas. As narrativas são em geral movimentadas e curiosas, mas a transcrição de diversas leis, regras e rituais pode se constituir numa parte difícil e cansativa para as mentes que tanto prezam a liberdade, a espontaneidade e a criatividade características dos tempos atuais.


O desafio proposto neste trimestre é entender como a regra, a ordem e a estrutura facilitam o relacionamento com Deus, ajudam no progresso espiritual, revelam importantes lições do plano da salvação e não necessariamente aprisionam numa rotina insossa.


Quando Deus estabeleceu as regras e rituais para o povo de Israel, logo depois de sair do Egito, Ele estava mais do que colocando ordem e transformando uma multidão em nação. Ele estava propondo um sentido de direção, um progresso, um caminhar, que havia começado na escravidão e caos do Egito e deveria terminar na Terra Prometida.


Para quem havia passado séculos imerso numa cultura adversa, desagregadora e politeísta, os rituais expressavam a verdade religiosa de maneira visual (equivalente à TV, em nossa cultura!) e não de maneira verbal (equivalente ao rádio). Por isso, eles têm muito a dizer a uma geração como a nossa, individualizada, e perigosamente informal.


Através das cerimônias, tanto o ser humano se comunicava com Deus pedindo perdão, purificação, poder, vitória, salvação, quanto Deus falava ao adorador que ele fora aceito, purificado, perdoado, etc. Elas estabeleciam formas, parâmetros, canais de comunicação, e oportunidades frequentes e repetidas para facilitar nossa aproximação de Deus.


Além de lições diárias sobre o interesse de Deus por Seu povo e de Sua presença contínua, serviam ainda como fator de identidade do povo de Deus: quem os praticava estava dentro, era companheiro de jornada, era mais confiável; quem não os praticava era gentio, não andava na mesma direção, e podia ser até um inimigo.


Tenha tudo isso em mente, não só ao estudar e ao apresentar a lição desta semana, mas sempre que se aproximar do livro de Números, que fornece importantes revelações do caráter de Deus e também da pecaminosidade humana, enquanto Deus conduzia Seu povo, desde o Egito ao Sinai, do Sinai a Cades, e finalmente às planícies de Moabe.


I. Dedicação do altar


Estamos diante do capítulo mais longo do Pentateuco (89 versículos) e, à primeira vista, um dos mais cansativos, pois repete os procedimentos e as ofertas dos 12 príncipes, líderes de cada uma da 12 tribos de Israel, os quais trouxeram os mesmos objetos e animais para oferecer na cerimônia de inauguração do santuário portátil, que deveria acompanhar o povo de Israel em sua jornada até Canaã.


Esse evento ocorreu entre os dias 1 e 12 do primeiro mês, do segundo ano depois da saída do Egito, portanto, cronologicamente vem depois de Levitico 8:10.


Cada príncipe trouxe:


  • um prato de prata (servia para misturar massas ou cereais) com peso aproximado de 1.400g.
  • uma bacia de prata (serviria para recolher o sangue dos sacrifícios) com peso aproximado de 840g.
  • uma colher de ouro (provavelmente utilizada para recolher as cinzas) com peso aproximado de 120 g.
  • todos esses recipientes foram oferecidos cheios de azeite, farinha e incenso.
  • um novilho + um carneiro + um cordeiro (todos com um ano de idade), portanto adequados para os holocaustos.
  • um bode, para oferta pelo pecado.
  • vários outros animais (2 bois + 5 carneiros + 5 bodes + 5 cordeiros), como ofertas pacíficas.
  • cada 2 príncipes se uniram para ofertar ainda um carro + uma junta de bois.

Algumas lições que podemos extrair:

  1. Todas as tribos tinham posição igual diante de Deus.
  2. Todas participavam igualmente do sustento do sacerdócio.
  3. Ninguém se isentou da adoração a Deus. De forma solene e participativa, cada um reconheceu que tinha de se integrar ao plano da salvação.
  4. As ofertas de adoração tinham valor prático, eram equipamentos e materiais essenciais que os sacerdotes e levitas passariam a usar para desempenhar suas funções.
  5. Eram presentes especiais, valiosos e caros, que representavam bem o esforço de oferecer, com sacrifício, o melhor para Deus. Uma lição de generosidade e desprendimento, portanto.
  6. A repetição meticulosa e detalhada de cada dádiva individual, com o devido crédito, nome por nome, tribo por tribo, sem resumo nem massificação, mostra como Deus valoriza cada indivíduo como se ele fosse o único, não importa o espaço nem o tempo que isso requeira. Lembra-nos também que os registros celestiais são individuais e absolutamente detalhados.

II. Comunhão com Deus


Aqui destaca-se o último verso, 89, desse memorável capítulo da dedicação do altar e do santuário, para mostrar a reação de Deus, a forma maravilhosa como Deus respondeu. Adoração e sacrifício nos aproximam de Deus e nos preparam para ouvir Sua mensagem.


Esse verso diz que Moisés entrou no santuário, foi ao encontro de Deus, no local previamente combinado, e Deus foi ao seu encontro, de forma gloriosa, solene, mas também apresentando uma mensagem audível e clara. Comunhão com Deus é isso: uma comunicação nos dois sentidos, Deus nos ouve e nós atendemos e obedecemos.


Afinal, como disse Gordon Whenham: “O tabernáculo não era um santuário vazio, mas o palácio do Deus vivo.”


Tanto ao estudar quanto ao expor esta parte, sugiro relembrar os conceitos de transcendência e imanência.


Podemos meditar sobre nossos privilégios (e correspondentes responsabilidades), pois hoje podemos ir até a presença de Deus diretamente, pelos méritos de Cristo, e não temos que parar na porta do santuário e ficar dependendo do sumo sacerdote ou de Moisés para ter acesso ao Lugar Santíssimo ou Santo.


Com que frequência e com que espírito temos exercido essa vantagem, e quais os resultados evidentes de nossos colóquios com a Divindade?


III. Luz no santuário


O capítulo 8 de Números descreve o cerimonial da inauguração do altar de sacrifícios, a partir da qual o fogo jamais deveria ser apagado e termina relatando como o shekiná, a glória de Deus se manifestava sobre o propiciatório, no Lugar Santíssimo. Isso ocorria quando Moisés entrava no tabernáculo. O autor de Números encaixou na passagem seguinte o relato de como foi acesso (e deveria ser assim mantido) o fogo das lâmpadas do Lugar Santo. Assim se completou a relação: havia fogo contínuo no pátio, haveria luz contínua (menorá) no Lugar Santo e a manifestação da glória divina (shekiná) no Santíssimo.


Luz e fogo representam a presença e bênção vivificadoras de Deus.


A localização do candelabro (menorá) projetando sua luz sobre a mesa dos pães asmos (que representava o povo de Deus sendo continuamente iluminado e assistido pelo Espírito Santo), conforme se depreende do verso 2, essa é outra lição para ser explorada.


O menorá (com suas 7 lâmpadas a óleo) estabelece o simbolismo desse óleo como sendo o Espírito Santo, através das passagens de Zacarias e Apocalipse.


IV. Dedicação dos levitas


Aqui abordamos a parte principal do capítulo 8, que trata da consagração dos levitas.


Talvez seja bom relembrar alguns fatos que foram apresentados anteriormente e também as informações que estão no quadro abaixo, para entender os seguintes aspectos:


  1. Os levitas ficaram de fora do censo dos israelitas, quando foram contados todos os homens de 20 anos para cima, capazes de ajudar nas guerras.
  2. Isso foi determinado porque essa tribo foi escolhida por Deus para oficiar em favor do povo, ajudando os sacerdotes, dando manutenção e transportando e montando o tabernáculo, além de cuidarem da segurança das instalações. Assim, os levitas foram os precursores dos diáconos.
  3. Veja no esquema abaixo como as 3 famílias dos levitas se acampavam em volta do tabernáculo (meraritas, ao norte; coatitas, ao sul; gersonitas, a oeste; e Moisés, Arão e seus filhos, os sacerdotes, acampavam a leste, na entrada do tabernáculo). Esse esquema mostra ainda a posição de cada uma das 12 tribos de Israel no acampamento, o estandarte que caracterizava cada ala, e o número indica a ordem nos deslocamento
  4. com342009
  5. Os meraritas eram os responsáveis pelo transporte, montagem e conservação das peças mais pesadas, estruturais, do tabernáculo (colunas, bases, tábuas e varais). Por isso, da oferta dos príncipes, eles receberam 4 carros e 4 juntas de bois.
  6. Os gersonitas eram responsáveis pelas cortinas, coberturas, tecidos e outras peças mais leves, por isso receberam 2 carros e 2 juntas de bois.
  7. Os coatitas tiveram o privilégio de cuidar dos objetos mais sagrados (arca, candelabro, mesa e altares), os quais deviam ser transportados nos ombros e tratados com muita reverência, razão porque não tiveram que contar com nenhum veículo para transporte.
  8. Os últimos versos do capítulo 8 informam que os levitas começavam em seu ofício aos 25 anos de idade e eram aposentados aos 50. A partir dessa idade, ainda podiam prestar serviço voluntário. Como o texto de Número 4:3 menciona 30 anos de idade para o começo efetivo do trabalho, conclui-se que dos 25 aos 30 passavam por um período de treinamento.
  9. Sendo que Arão e seus filhos foram escolhidos para formar o “clero oficial”, todos os demais levitas passaram a ser considerados “leigos consagrados”, o que justifica toda a cerimônia de consagração relatada no capítulo 8.

A cerimônia de consagração incluiu:


  1. Aspersão da água da expiação. O significado certamente era cerimonial; não havia mérito na água, mas representava a purificação de todo pecado.
  2. Raspar os pelos do corpo. Outra forma de mostrar limpeza, também uma distinção exterior, visível, separando os levitas dos sacerdotes e nazireus.
  3. Lavar as vestes. Os sacerdotes ganhavam roupa especial para executar suas funções, mas os levitas deviam lavar e preparar suas melhores vestes para usar quando estivessem no serviço.
  4. A purificação também incluía a mente e o coração. Nenhuma mácula, culpa ou pesar deveria interferir na hora ou na atividade de um levita.
  5. Os versos 8 a 13 descrevem uma tocante cerimônia na qual os levitas impuseram as mãos sobre os novilhos e através do sacrifício dos animais foi feita simbólica a expiação por eles. Ou seja, os animais foram mortos para que os levitas prosseguissem sendo uma oferta viva para o serviço.
  6. Por sua vez, os levitas receberam a imposição das mãos por parte dos representantes de todas as tribos, colocando sobre eles a responsabilidade de guardiães da espiritualidade e responsáveis pelo ministério especial no santuário, em lugar dos primogênitos de Israel.
  7. O verso 15 diz ainda que foram apresentados como “oferta movida”, o que pode significar que a cerimônia deve ter incluído deslocamento de cada um dos levitas até as proximidades da entrada do santuário, num movimento orientado na direção para onde eles deveriam, por seu ofício, gestos, palavras e exemplo de vida, ajudar a conduzir o povo: em direção ao santuário, ao encontro com Deus.

O estudo destaca o momento mais profundamente significativo da dedicação dos levitas, quando se menciona que eles foram separados “para fazerem expiação pelos filhos de Israel”, ou seja foram colocados como “para-raios”, protegendo o povo para que não fossem atingidos pela ira divina. Mais do que auxiliar, ensinar e guiar, os levitas deveriam proteger o povo sob todos os aspectos. Pensemos nisso, você e eu que somos os levitas modernos!



Autor:
Márcio Dias Guarda
Editor de Livros
Casa Publicadora Brasileira





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