sexta-feira, 10 de setembro de 2010

A eleição da graça (comentário ao estudo nº 11)




Em Romanos 10 e 11, Paulo prossegue com suas considerações quanto à situação de seus compatriotas frente ao evangelho por eles rejeitado. Essa rejeição, confirmada no ano 34 quando apedrejaram Estêvão, os fez perder o status de etnia eleita. A partir daí, o povo de Deus seria exclusivamente a igreja cristã, a “
raça eleita, o sacerdócio real, a nação santa” (1Pe 2:9), constituída por membros de todas as etnias, judeus e gentios, na linguagem de Paulo. Portanto, a salvação está disponível para os judeus individualmente da mesma forma que a qualquer povo deste mundo, e é nosso dever a formulação e execução de planos definidos para a evangelização deles. Quanto a isso, Ellen G. White é explícita, como aparece no fim do estudo da quarta feira, e principalmente no “Estudo adicional” de sexta-feira. Às citações aí contidas, acrescento as seguintes:

Vi que Deus havia abandonado os judeus como nação; mas os indivíduos entre eles seriam, contudo, convertidos e habilitados a rasgar o véu de seus corações e ver que a profecia em relação a eles tinha-se cumprido. Eles receberão Jesus como Salvador do mundo e verão o grande pecado de sua nação em tê-Lo rejeitado e crucificado” (Primeiros Escritos [1967], p. 213).

Alguns têm aprendido a ver no humilde Nazareno, a quem seus antepassados rejeitaram e crucificaram, o verdadeiro Messias de Israel. Ao compreenderem o significado das profecias familiares há tanto tempo obscurecidas pela tradição e errada interpretação, seus corações se têm enchido de gratidão a Deus pelo dom inaudito que Ele outorga a todo ser humano que escolhe aceitar Cristo como Salvador pessoal... Desde os dias de Paulo até o presente, Deus, pelo Seu Espírito Santo, tem estado a chamar tanto judeus como gentios... Quando este evangelho for apresentado em sua plenitude aos judeus, muitos aceitarão Cristo como o Messias (Atos dos Apóstolos [1999], p. 380).

Há entre os judeus alguns que, como Saulo de Tarso, são poderosos nas Escrituras, e esses proclamarão com maravilhoso poder a imutabilidade da lei de Deus. O Deus de Israel fará que isto suceda em nossos dias (Ibidem, p. 381).

Para mim, tem sido coisa estranha que tão poucos estejam preocupados com o trabalho pelo povo judeu, disperso por tantas terras... As faculdades adormecidas do povo judeu devem ser despertadas... Haverá muitos conversos entre os judeus, e esses conversos ajudarão a preparar o caminho do Senhor... Judeus conversos hão de ter parte importante a desempenhar nos grandes preparativos a ser feitos no futuro para receber Cristo, nosso Príncipe (Evangelismo [2008], p. 578, 579).

I. O fim da lei

No texto de estudo para hoje, Rm 10:1-4, chamam a atenção as palavras do verso 4: “...o fim da lei é Cristo, para justiça de todo aquele que crê.” Essa declaração é costumeiramente usada por aqueles que negam a validade da lei dos Dez Mandamentos depois da morte de Jesus. “A lei terminou em Cristo, e não mais temos nenhuma obrigação para com ela”, afirmam. Mas os que assim se expressam, o fazem apenas em referência ao quarto mandamento, que requer a observância do sábado como dia do Senhor. Em são juízo, ninguém diria que a cruz autoriza os que creem em Cristo a matar, roubar, adulterar, etc., atitudes condenadas pela lei tanto quanto a transgressão do dia de guarda.

Ademais, afirmasse Paulo, com estas palavras, que a lei foi abolida pela morte de Cristo, e estaria fortalecendo a (falsa) acusação de seus adversários de que ele era um antinomista, acusação esta, como temos notado, que o apóstolo repudia em sua epístola. Então, qual é o significado real de suas palavras?

Bem, o estudo nos lembra de que a palavra grega télos, traduzido como “fim” em Romanos 10:4, “também pode ser traduzida como objetivo, propósito.” Portanto, fim significando finalidade. “
Cristo é o propósito final da lei, no sentido de que a lei deve nos levar a Jesus.” Esse é indiscutivelmente o sentido de télos em 1 Pedro 1:9, onde é afirmado que o “fim da fé” é a salvação. Ninguém deve imaginar, todavia, que, uma vez salvo, o crente não mais precisa da fé; muito ao contrário!

Creio que mais do que isso está envolvido no texto. Com efeito, télos significa “fim”, como quando o texto sagrado fala do fim desta era (Mt 24:6, 14; 1Co 15:24). Aplicando-se este sentido à lei, Cristo é o fim, o término do empenho no cumprimento dela como meio de justiça; a cessação da lei como recurso de salvação.

Télos também significa finalidade, objetivo, etc., como no texto de Pedro acima referido, e também em 1 Timóteo 1:5, onde é traduzido “intuito”. O termo, todavia, tem mais de dois significados, e Paulo, preferencialmente a um termo de sentido mais restrito, empregou télos para deixar claro que Cristo é o tudo da lei.

De fato, se quisesse apenas afirmar que Cristo é o fim da lei, no sentido de que ela caducou na cruz, que acabou ali, Paulo teria empregado péras, que significa limite, o ponto extremo, conclusão, terminação, fim (como em Hb 6:16). Da mesma forma, se ele quisesse afirmar que Cristo é apenas a finalidade, o objetivo, o propósito da lei, teria  empregado próthesis ou skopós, ou ainda énnoia.

Além dos dois sentidos acima, télos também significa: imposto (como em Mt 17:25 e Rm 13:7); destinação última (como em Hb 6:8),pleno desempenho, execução, desencargo, cumprimento (como em Lc 22:37); tratamento final (como em Tg 5:11); estágio final (com em 1Co 10:11); resultado (como em Rm 6:21); e plenitude (como em 1Ts 2:16).

É possível divisar em cada um desses sentidos aquilo que Cristo é da lei. Ele é a plenitude dela, considerando que, na qualidade de vida que Cristo viveu, vemos até onde a vai a lei e o que ela abrange. Ele é o resultado da lei, no sentido de que as reivindicações dela, se perfeitamente cumpridas, resultam numa qualidade de vida precisamente idêntica à vida de Jesus.

Ele é o estágio final da lei, no sentido de que ela não pode ser exibida, exposta, desvelada mais do que o foi em Jesus.

Ele é a demonstração mais clara do tratamento final da lei: tudo o que Jesus sofreu agonizando até morrer, é claro, por tomar nosso lugar e nos salvar, é uma antecipação daquilo que a lei requererá que ocorra no último dia com os ímpios impenitentes e perdidos, os quais, por rejeitarem o que Ele fez por eles, “
terão de sofrer a angústia sentida por Cristo na cruz...” (Testemunhos Para a Igreja, v. 1 [2004], p. 124).

Em Jesus, a lei alcança plena execução, desencargo e cumprimento, pois foi profetizado que Ele engrandeceria a lei e a tornaria gloriosa (Is 42:21, Tradução Brasileira). “
Cristo... mostrou que ela está baseada no amplo fundamento do amor a Deus e amor aos homens, e que a obediência a seus preceitos compreende todo o dever do homem. Em Sua própria vida Ele deu exemplo de obediência à lei de Deus. No Sermão da Montanha Ele mostrou como seus requisitos vão além dos atos exteriores, e penetram os pensamentos e as intenções do coração” (Atos dos Apóstolos [1999], p. 505).

Além disso, em Jesus não há anomía, isto é, ilegalidade de espécie nenhuma. É plena Sua harmonia com a lei divina e, portanto, com a natureza e caráter de Deus. O cumprimento da lei por Cristo foi total.

Ele também é a destinação última da lei, no sentido de que Sua exaltação e glorificação a partir da ressurreição se tornam uma clara demonstração daquilo que aguarda os que a cumprem perfeitamente, pois Ele viveu integralmente seus justos reclamos. Por nossa vez, também seremos exaltados e glorificados, pois a lei não reserva outro destino final para aqueles que estiverem revestidos da perfeita justiça de Cristo.

Finalmente, Jesus é o imposto, o tributo que ela cobra daqueles que almejam a salvação. Como “
o salário do pecado é a morte” (Rm 6:23), e só em Jesus e por Jesus é possível a libertação do pecado, o “imposto” a ser pago pela vida eterna, requerido pela própria lei, é a aceitação dEle como Salvador. Naturalmente o pecador pode se omitir de pagar tal preço; mas, nesse caso, terá que pagar um preço correspondente, isto é, ele mesmo terá que morrer pelo seu pecado. A lei, portanto, se revela um credor implacável: ou nós pagamos, ou Cristo paga em nosso lugar. Não há uma terceira alternativa. Qual é nossa escolha?

Notemos, portanto, quanta coisa está envolvida na declaração paulina de Romanos 10:4. Tudo isso foi tecido por Paulo, sob a direção do Espírito Santo, no esforço de ajudar “seus irmãos... segundo a carne” (9:3), os judeus, a entender que só em Jesus existe a justiça necessária para se desfrutar verdadeiramente a vida. A situação deles era tal que, rejeitando a justiça de Cristo, estabeleciam “a sua própria”, não se sujeitando “
à que vem de Deus.” (Rm 10:3). O zelo que tinham por Deus, um zelo sem entendimento (v. 2), era-lhes de nenhuma valia, pois não se apoderando da justiça de Cristo não se apoderaram de justiça nenhuma, pois fora dEle não há justiça.

Não incorremos nós, adventistas, no mesmo perigo? Com razão, alguém já observou que o adventismo é um terreno fértil para o legalismo. Temos que estar constantemente atentos.

 II. A eleição da graça 

Naturalmente, por exiguidade de espaço, a lição desta semana aborda Romanos 10 apenas em seus primeiros quatro versículos. Mas o restante do capítulo também é importante para se observar a linha de raciocínio de Paulo quanto ao meio correto de salvação, no empenho por admoestar seus concidadãos.

Nos versos 5-8, ele contrasta a justiça da lei com a palavra do evangelho no coração. Essa palavra não é outra senão o próprio Cristo (cf. Jo 1:1, onde o termo “Verbo” equivale a Palavra). O pecador só consegue obter essa justiça se tiver Cristo no coração, pois essa experiência resultará em que a própria lei de Deus seja escrita na mente humana, conforme a provisão do novo concerto (Hb 10:16). Em outras palavras, Cristo é o caminho único para se alcançar aquilo pelo que, inutilmente, os judeus tanto se esforçavam por suas “obras da lei”.

Nos versos 9-13, Paulo expõe de maneira bem objetiva o método de salvação com uma de suas inevitáveis consequências, o testemunho da fé através da pregação. Daí ele realçar a necessidade de pregadores para que o evangelho alcance os corações (v. 14, 15). Nos versos 16-21, ele volta à carga sobre a incredulidade dos judeus, demonstrando que esta ocorreu não por falta de oportunidade de ouvirem o evangelho. De fato, segundo livro de Atos, o evangelho sempre foi pregado a eles primeiramente; e continuaria a sê-lo por mais algum tempo.

A pergunta de Paulo em 11:1, seguida de sua costumeira resposta, não contradiz o fato de que os judeus, por terem rejeitado Jesus como o Messias, perderam o privilégio de etnia eleita, mesmo porque jamais Deus considerou como verdadeiros israelitas aqueles que são “filhos de Abraão” apenas por consanguinidade (9:6-8), os quais Paulo chama de Israel “
segundo a carne” (1Co 10:18). Os verdadeiros filhos de Abraão são exclusivamente os da fé, pois só os que são de Cristo são “descendentes de Abraão e herdeiros segundo a promessa” (Gl 3:29). Então, “Seu povo” é formado por aqueles que, dentre judeus e gentios, recebem Cristo como Salvador e Senhor. A estes, Deus jamais rejeita.

Isso é o mesmo que dizer que, de toda a multidão que professa temer a Deus, apenas o remanescente será salvo (Rm 9:27), isto é, que não será rejeitado. Não basta apenas professar; é necessário viver aquilo que se professa, e isto apenas o remanescente faz.

Paulo lembra que, no tempo de Elias, quando ocorrera uma das maiores apostasias da história de Israel, um remanescente de sete mil havia permanecido fiel 
como prova de que Deus não havia rejeitado o Seu povo (11:2-4). Isso foi igualmente verdade quando Paulo escreveu aos romanos (v. 5) e, evidentemente,  é verdade até nossos dias.

Da mesma forma que há um remanescente no professo povo de Deus, o Senhor também tem um povo lá fora, espalhado em todas as nações da Terra (inclusive entre os judeus), um remanescente no mundo, o qual ouvirá o convite de Deus para deixar Babilônia e se unir aos fiéis (Ap 18:1). “
O Senhor declarou que os gentios serão recolhidos, e não somente os gentios, mas também os judeus” (Evangelismo, p. 578); então, e só então, “haverá um rebanho e um pastor” (Jo 10:16).

III. – O ramo enxertado

Naturalmente, não era necessário que os judeus rejeitassem o evangelho para que este passasse a ser pregado aos gentios. Paulo, todavia, afirma que o tropeço deles ensejou uma oportunidade de serem levados a ciúmes através da pregação estendida aos gentios (Rm 11:11). Ele mesmo se esforçava por ganhar o maior número de gentios para incitar seus conterrâneos à emulação, numa tentativa de salvar pelo menos alguns deles (v. 13, 14). Segundo a narrativa do livro de Atos, três vezes Paulo censurou a incredulidade dos judeus para salientar que a mensagem de salvação estava sendo estendida aos gentios, e que eles a aceitavam (ver At 13:46, 47; 18:6; 28:28). À luz do que ele disse em Romanos 11, ele agiu assim tão radicalmente por amor de seu próprio povo.

Nos versos 12 e 15, então, Paulo deixa claro que Deus ainda tem planos com os judeus:
“... se a transgressão deles redundou em riqueza para o mundo... quanto mais a sua plenitude! ... se o fato de terem sido rejeitados trouxe reconciliação ao mundo, que será o seu restabelecimento, senão vida dentre os mortos?

Estou convencido de que, na fase final da pregação da tríplice mensagem angélica em todas as partes do mundo, um grande número de judeus se converterá à verdade e unirá sua voz com a do remanescente de Deus, para conduzir Sua obra à conclusão. Isso cumprirá o que Paulo anunciou e o que o Espírito de Profecia afirma principalmente em Evangelismo, p. 578, 579, como citei na introdução do presente comentário: “
Haverá muitos conversos entre os judeus, e esses conversos ajudarão a preparar o caminho do Senhor... Judeus conversos hão de ter parte importante a desempenhar nos grandes preparativos a ser feitos no futuro para receber a Cristo, nosso Príncipe.” A lição de amanhã toca esse ponto.

A exemplo de Jesus, que usou a natureza para, por meio de parábolas, extrair importantes lições espirituais, Paulo, a seguir (v. 17-24), usou a metáfora do corte e enxerto, comum entre agricultores, para falar de rejeição e aceitação da parte de Deus. A primeira situação (corte) ocorre em consequência da incredulidade, enquanto a segunda (enxerto) é através da fé (v. 19, 20).

Há, todavia, um detalhe que deve ser notado. A colocação paulina inverte o processo natural do enxerto. Habitualmente, Para que a produção do fruto seja assegurada, é o ramo da boa planta que é enxertado na planta brava, não o contrário. Paulo usa a figura de uma oliveira para representar a comunidade de Deus (ver Jr 11:16 e Os 14:6 onde Israel é identificado por essa árvore), e fala de ramos de oliveira brava (os gentios) enxertados na boa (Rm 11:24) para participar de sua seiva e raiz (v. 17).

Acho que essa inversão foi proposital da parte do apóstolo, pois a conversão do pecador é um dos maiores milagres que Deus opera, o que extrapola à mera expectativa natural. Ademais, ele certamente quis salientar o fato de que os “ramos naturais” (os judeus) não haviam produzido o fruto esperado, o que não ocorreu com os “ramos não naturais” (os gentios) enxertados, “contra a natureza”, na oliveira boa (v. 24).

A raiz, que nutre os ramos com a seiva extraída do solo é, primeiramente, o próprio Senhor Jesus, aquele que alimenta Seu povo e o fortalece para tê-lo vitorioso nos embates da vida cristã. E, secundariamente, Abraão, o pai de todos os que creem, “os ramos” (v. 16), não importa se “circuncidados”, os judeus, ou “incircuncidados”, os gentios (4:9-12).A “seiva” significa, naturalmente, as provisões do concerto abraâmico, das quais participam todos os que aceitam o evangelho.

Concluindo a metáfora, Paulo registra uma advertência e uma palavra de estímulo (v. 19-24). Os ramos enxertados não devem se gabar sobre aqueles que foram cortados, porque estes, quando crerem, serão enxertados, e aqueles, se perderem a fé, serão inevitavelmente cortados. Como a lição observa, o conceito de “uma vez salvo, salvo para sempre” é pura fantasia. Serão salvos os que permanecerem fiéis até o fim (ver Mt 24:13). Por outro lado, àquele que se desviou da verdade, é facultada a oportunidade de restauração, ou seja, de reatar sua comunhão e compromisso com Deus, voltando à comunidade dos fiéis. Só um Deus de amor poderia agir assim.

IV. Um mistério revelado 

O “mistério revelado” é claramente definido por Paulo no fechamento de sua epístola: “Ora, Aquele que é poderoso para vos confirmar segundo o meu evangelho e a pregação de Jesus Cristo, conforme a revelação do mistério guardado em silêncio nos tempos eternos, e que, agora, se tornou manifesto e foi dado a conhecer por meio das Escrituras proféticas, segundo o mandamento do Deus eterno, para obediência por fé, entre todas as nações...” (Rm 16:25, 26).

Nos termos de 11:25, “
a obediência por fé entre todas as nações” foi ensejada pelo endurecimento de Israel, de natureza parcial (porque há sempre alguns que estão dispostos a crer em Jesus agora, razão por que devemos trabalhar pelos judeus hoje) e temporária (porque é “até que haja entrado a plenitude dos gentios”). Quando a obra de pregar o evangelho a todas as etnias (Mt 24:14) estiver para ser concluída, muitos judeus se converterão, ou, como a lição declara, “[nesse] momento, então, muitos judeus começam vir a Jesus.

Todo o Israel será salvo” (v. 26) quando houver “entrado a plenitude dos gentios” com a adesão desses “muitos judeus”. Podemos divisar aqui a ideia de que as doze tribos de Israel estarão aí restauradas. Com a ascendência de Roboão, filho de Salomão, ao trono em 931/930 a.C., o reino foi dividido, as dez tribos do norte formaram uma dinastia à parte das duas tribos do sul, Judá e Benjamin. O processo de apostasia das tribos do norte foi rápido e avassalador. Em 722, os assírios conduziram as dez tribos para o cativeiro do qual jamais retornariam, pois acabaram se diluindo entre as nações para onde haviam sido exiladas. O cativeiro das tribos do sul ocorreu a partir de 605. Foram deportados para Babilônia, de onde retornaram setenta anos mais tarde. Esse retorno, todavia, foi parcial. Um grande grupo decidiu permanecer em seu novo habitat, formando a comunidade judaica da Diáspora. Lucas registra que, por ocasião do Pentecostes, que inaugurou as atividades da igreja, faziam-se presentes em Jerusalém “judeus, homens piedosos, vindos de todas as nações debaixo do céu” (At 2:5).

A “
esperança de Israel” envolvia a restauração das doze tribos, o que ocorreria sob a regência do Messias. Os judeus estavam certos quanto a esse fato, mas não da forma política e militar como, pensavam, deveria ocorrer. Quando Jesus Se manifestar nas nuvens com poder e glória, Ele enviará Seus anjos, “os quais reunirão os Seus escolhidos, dos quatro ventos, de uma a outra extremidade dos céus” (Mt 24:31). Esses “escolhidos” são os salvos de todas as épocas e lugares, muitos dos quais aguardam a ressurreição. Mas os salvos vivos naquele glorioso dia, identificados no Apocalipse como os “144 mil” (a meu ver um número simbólico) são provenientes “de todas as tribos de Israel” (7:4).

Esta é a restauração de que o Novo Testamento fala, principalmente nos escritos de Paulo: uma restauração antes espiritual que étnica, condizente com a maneira de Deus considerar os verdadeiros israelitas: aqueles que são descendentes de Abraão através da fé, não do sangue. Sem dúvida, aquilo que Paulo falou dos judeus (membros da tribo de Judá) é também verdade quanto aos membros de qualquer outra tribo:
“... judeu é aquele que o é interiormente, e circuncisão, a que é do coração, no espírito...” (Rm 2:29); e é no coração que Cristo deve habitar (Ef 3:17).

Aqui, todos os que compõem a igreja de Deus, não importando a raça, estão incluídos, pois aqueles que recebem a Cristo e se unem ao Seu povo não mais são “
estrangeiros e peregrinos, mas concidadãos dos santos, e [são] da família de Deus” (2:19). Por outro lado, Jesus deixou claro que quem se desliga da igreja deve ser considerado “gentio e publicano” (Mt 18:17), isto é, “separado da comunidade de Israel” (Ef 2:12). Logo, igreja e Israel se equivalem.

Assim, quando o povo de Deus de todas as épocas e lugares estiver finalmente e eternamente salvo, habitando aquele reino cuja capital é a Nova Jerusalém, a cidade guarnecida com doze portas que trazem inscritos em si “os nomes da doze tribos de Israel” (Ap 21:12), então terá cumprido a profundamente significativa afirmação paulina de que “todo o Israel será salvo” (Rm 11:26). Preparemo-nos para esse grandioso evento!

V. A salvação dos pecadores 

Muito do que comentei na lição de ontem é aplicável à lição de hoje, pois tem que ver com a maneira de Deus conduzir as coisas até que toda a humanidade esteja plenamente salva, “redimida do cativeiro da corrupção para a liberdade da glória dos filhos de Deus” (8:21). A pregação é vital no processo de salvação, pois é através dela que a fé é despertada (10:17). Anjos que nunca pecaram não são comissionados a anunciar o evangelho, pois, se o fizessem, haveriam de proclamá-lo como simples teoria, e não como “o poder de Deus para salvação de todo aquele que crê” (1:16). Não poderiam dizer: “Já o testamos em nossas vida e sabemos que funciona.” 

São os membros da igreja que têm esse privilégio, pois é suposto que eles já desfrutam da salvação em Cristo, e podem anunciar o evangelho como algo real, que salva mesmo, como prova sua própria experiência. Com base em 11:31, a lição, em sua última parte, salienta a importância desse fato, lembrando que, uma vez tendo nos alcançado a misericórdia “oferecida em Jesus”, nós a mostraremos aos outros, principalmente, acrescento eu, por meio do que ela operou em cada um de nós.

Em 11:28-31 Paulo conclui suas considerações iniciadas com o capítulo 9, sumariando o trato de Deus com judeus e gentios, salientando que os primeiros continuavam no apreço de Deus em virtude do pacto abraâmico; em outros termos, “
por causa dos patriarcas”, como diz o texto.

Esse pacto estipulava que, em Abraão seriam benditas “
todas as famílias [ou nações] da Terra” (Gn 12:3; 18:18). Em outras palavras, o pacto incluía igualmente a salvação dos gentios. Mais que isso, Abraão se tornaria “pai de numerosas nações” (17:4, 5); na verdade, poderia ser dito que o patriarca se tornou pai de todas as nações, no sentido de que membros de todas elas se tornam crentes em Jesus, e, portanto, filhos de Abraão.

Assim, ao instaurar o pacto abraâmico, Deus estava dando prosseguimento ao cumprimento de Seu glorioso plano de, como diz a lição, “
salvar a humanidade”, plano esse anunciado desde o Éden perdido (Gn 3:15). Agora, executado o plano com o sacrifício de Jesus, restava aplicá-lo em toda a sua extensão, conforme seu propósito original. Isso foi alcançado com a pregação do evangelho primeiramente aos judeus e depois também aos gentios, como o livro de Atos informa.

Valendo-se de um jogo de palavras, Paulo mostra como Deus opera com discernimento e grandeza: os gentios, no passado, foram desobedientes, mas agora alcançavam a misericórdia, “
à vista da desobediência” dos judeus (v. 30); e os judeus agora se mostravam desobedientes, “para que, igualmente, alcancem misericórdia, à vista da que... foi concedida” aos gentios (v. 31). Todos foram tidos como pecadores perdidos (3:9, 23), para Deus “usar de misericórdia para com todos” (v. 32).

Na verdade, o inimigo quis frustrar o propósito de Deus levando os judeus à incredulidade. Mas como é impressionante ver que Deus Se valeu precisamente da incredulidade deles para que Seu propósito fosse plenamente cumprido, por meio da salvação estendida a todos os povos! Como disse Paulo, “os dons e a vocação de Deus são irrevogáveis” (v. 29).

A essa altura, nada restava a Paulo, senão registrar a inspirada doxologia dos versos 33-36, que ele abre exaltando a “
profundidade da riqueza, tanto da sabedoria como do conhecimento da Deus”, a insondabilidade de “Seus juízos” e a inescrutabilidade de “Seus caminhos”, para encerrar reiterando que “dEle, por meio dEle, e para Ele, são todas as coisas. A Ele, pois, a glória eternamente.” 

E, com o apóstolo, uno minha voz também dizendo: “Amém!”


Extraído de: http://www.cpb.com.br/htdocs/periodicos/licoes/adultos/2010/com1132010.html

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